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ATOMOXETINA no TDAH: MECANISMO, EFICÁCIA, SEGURANÇA E EFEITOS COLATERAIS




O Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é uma condição neurocomportamental comum na infância e adolescência, caracterizada por desatenção, hiperatividade e impulsividade.

A atomoxetina (nome comercial: Atentah) é uma alternativa eficaz e segura aos medicamentos estimulantes mais comumente usados para tratar o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) em crianças de 6 a 12 anos, adolescentes e adultos.

A atomoxetina é geralmente considerada segura e eficaz e seu uso está associado a relativamente poucas reações adversas. O primeiro não estimulante aprovado para tratamento de TDAH nos Estados Unidos pela Food and Drug Administration (FDA) ocorreu em 2002 e já existem estudos bem fundamentados que comprovam a segurança e eficácia. No Brasil, foi aprovado pela ANVISA em julho de 2023 e começou a ser distribuído nas farmácias em janeiro de 2024.

Este artigo esclarece o mecanismo de ação, eficácia, segurança e dosagem dessa medicação, com base em evidências científicas.

 

Qual o mecanismo de ação da atomoxetina?

 

Acredita-se que os efeitos da ação da atomoxetina esteja relacionada à inibição seletiva da recaptação pré-sináptica de norepinefrina (NE) no Córtex pré frontal (PFC).

Como um inibidor altamente seletivo da recaptação de norepinefrina (SNRI), a atomoxetina liga-se altamente ao transportador de recaptação de NE na membrana pré-sináptica do nervo e inibe a recaptação de NE.

Seu papel é aumentar a concentração de NE na fenda sináptica, o que resulta em elevações dos níveis sinápticos de noradrenalina no sistema nervoso central. No entanto, tem pouca ou nenhuma afinidade pelos transportadores de serotonina ou dopamina ou por outros receptores de neurotransmissores.

Além disso, a atomoxetina também é conhecida por modular a captação sináptica cortical de dopamina através da ação inespecífica do NET abundante no PFC, aumentando seletivamente os níveis de dopamina no PFC de uma maneira regionalmente específica, mas não em efeitos motores ou relacionados à recompensa ou áreas do corpo estriado, melhorando assim os sintomas do TDAH e a concentração da atenção.


Fonte: Fu D et cols, 2021


Felizmente, o progresso da neuroimagem nos últimos anos proporcionou novos conhecimentos sobre o tratamento do TDAH com atomoxetina. E alguns dos achados confirmam a associação de alterações estruturais e funcionais com os sintomas do TDAH:

  • PFC inferior direito : área chave de disfunção no TDAH durante o desempenho inibitório. A atomoxetina tem efeitos benéficos no controle inibitório, regulando a função frontal inferior direita.

  • Giro lingual esquerdo e giro occipital inferior : aumento de flutuações de baixa frequência (fALFF) foi correlacionado com a melhora da desatenção com o tratamento com atomoxetina.

  • Giros pré-centrais e pós-centrais bilaterais: diminuição do fALFF relacionada a melhora na hiperatividade/impulsividade

  • Córtex pré-frontal (DLPFC) e DMN (Default Mode Network), áreas relacionadas às funções executivas é ativada e melhora as funções de atenção e execução de tarefas em pacientes com TDAH, com efeito comparável ao metilfenidato.


A Atomoxetina é metabolizada principalmente pela enzima metabolizadora de drogas altamente polimórfica CYP2D6, que possui polimorfismo genético significativo. A capacidade metabólica das enzimas CYP2D6 à atomoxetina é diferente entre os indivíduos, afetando a eficácia terapêutica e o regime posológico do tratamento clínico do TDAH.


Qual a eficácia no Tratamento do TDAH em Crianças, adolescentes e adultos

 

Os estudos demonstraram melhorias clinicamente significativas nos sintomas principais do TDAH (desatenção, impulsividade e hiperatividade), bem como na qualidade de vida e regulação emocional com uso da atomoxetina.

Um estudo multicêntrico, aberto de 10 semanas com 604 pacientes pediátricos com TDAH mostrou que o tratamento com ATX reduziu em 56,7% as pontuações da escala de classificação de TDAH (ADHD-RS) e 69% dos pacientes não tiveram respostas significativas. OS pacientes que tiveram a resposta nos sintomas apresentaram melhora psicossociais e funcionais.

Schwartz e colegas, 2014, avaliaram a eficácia e segurança da atomoxetina em pacientes pediátricos com TDAH. Esta maior e mais abrangente meta-análise, incluindo 3.928 pacientes pediátricos, concluiu que a atomoxetina é superior ao placebo para o TDAH em vários resultados relevantes. Os resultados mostraram que o tratamento de curto prazo com atomoxetina pode melhorar significativamente os sintomas principais.

Embora a atomoxetina tenha demonstrado ser superior ao placebo, não existem neste momento evidências definitivas que sugiram eficácia comparável aos psicoestimulantes. Vários estudos comparativos de eficácia realizados em populações americanas e europeias sugeriram que, em comparação com a atomoxetina, o metilfenidato OROS resultou numa maior redução dos sintomas de TDAH.

A atomoxetina é um tratamento eficaz em todos os locais (Ásia, Europa, América do Norte e Rússia) e nas respostas de grupos étnicos (ou seja, caucasianos, Afro-americanos e latinos) na América parecem ser semelhantes.

Semelhante aos resultados de estudos de curto prazo, a atomoxetina permaneceu eficaz no tratamento a longo prazo do TDAH em crianças. A atomoxetina demonstrou ser eficaz até o final dos períodos de tratamento de 8 a 24 meses.

A meia-vida metabólica da atomoxetina no sistema nervoso central é longa, e o efeito inibitório de uma vez ao dia no NET pode durar até 24 horas, de modo a controlar os sintomas de pacientes com TDAH de forma sustentada e estável.

 

Como a atomoxetina age em pacientes com comorbidades?

 

Transtornos psiquiátricos comórbidos são comuns em pacientes com TDAH, incluindo TOD, transtornos de ansiedade e depressão, TEA, Tourette, transtornos de aprendizagem (TA), transtornos de comportamento disruptivo (TCDs).

Mais da metade das crianças e adolescentes com TDAH apresentam comorbidades e mais de um terço tinham duas ou mais comorbidades. Em particular, o TOD/transtorno de conduta (TC) está entre as comorbidades mais comuns com TDAH, afetando aproximadamente 50% das crianças com TDAH.

Até agora, uma série de estudos publicados sugeriu que a atomoxetina é eficaz no tratamento dos sintomas de TDAH em crianças com vários tipos de comorbidades. Em alguns casos, é possível que a atomoxetina tenha uma influência positiva nos sintomas de comorbidades.

A comorbidade de TDAH e Transtorno de Tiques e Síndrome de Tourette (ST)  é comum, com o TDAH ocorrendo em até 50% das crianças com esses diagnósticos. A atomoxetina parece ser eficaz no tratamento do TDAH sem agravamento dos sintomas de ambas as condições.

Allen et al. em 2005, demonstraram que a atomoxetina foi associada a um efeito benéfico na intensidade e gravidade dos tiques.

Cerca de 20–60% das crianças com TDAH apresentam dificuldades sociais semelhantes às do autismo se comparadas com as crianças com desenvolvimento típico e cerca de 30% serão diagnosticadas com TEA no período escolar ou adolescência.

Em alguns estudos até o momento, a atomoxetina demonstrou ser segura e eficaz no tratamento de sintomas de TDAH em algumas crianças com TEA, mas a taxa de resposta foi menor do que em crianças apenas com TDAH mas ainda há necessidade de estudos com maiores amostras.

 

IMPORTANTE!!!

Os medicamentos estimulantes são frequentemente o primeiro tratamento recomendado nos EUA e na Europa, mas a atomoxetina é uma boa alternativa para pessoas que não toleram ou não respondem ao psicoestimulantes (metilfenidato e lisdexanfetamina).

  Várias diretrizes ao redor do mundo (CADDRA, NICE, Academia Americana de Pediatria) recomendam, como primeira linha, psicoterapia comportamental e psicoeducação com treinamento parental antes da medicação para crianças menores de 6 anos.

Para crianças de 6 a 11 anos, a terapia comportamental baseada em evidências deve ser associada a psicoestimulantes em doses adequadas para reduzir os sintomas do TDAH.

Os planos de tratamento mais bem-sucedidos criam estratégias individualizadas que consideram a gravidade e prejuízo dos sintomas, perfil de tolerância e as comorbidades para definir o plano terapêutico adequado e mais seguro para cada paciente.

Quais as indicações da Atomoxetina?

 

A atomoxetina tem um efeito melhor no tratamento a longo prazo do TDAH e de pacientes com sintomas psiquiátricos comórbidos mas alguns efeitos colaterais podem pioras algumas condições em doses altas ou tóxicas.

A redução dos principais sintomas do TDAH resulta de melhora de múltiplas funções das crianças com o tratamento a longo prazo, incluindo função de aprendizagem, relacionamento com pares, relacionamento familiar, função cognitiva, função executiva, função social e assim por diante.

Alguns estudos demonstraram que comorbidades comuns (como TOD, transtorno de ansiedade, Tiques, Tourette e TEA) em pacientes com TDAH não pioram e até podem melhorar após a terapia com atomoxetina.

Em crianças com TDAH combinado com transtorno de tique transitório, a terapia com atomoxetina não afeta a secreção de receptores de dopamina e 5-hidroxitriptamina no organismo, evitando efetivamente o agravamento do transtorno de tique e tendo alta biodisponibilidade.

A atomoxetina também pode ser o tratamento de primeira linha para pacientes com tiques comórbidos. Na verdade, a atomoxetina é recomendada como tratamento de primeira linha para pacientes com TDAH com transtorno de tique e ansiedade comórbidos na última diretriz chinesa revisada em 2015 pela Associação Médica Chinesa.

Porém, a taxa de melhora dos sintomas clínicos e dos efeitos terapêuticos em crianças após a terapia com atomoxetina varia de paciente para paciente. Para tratamento adicional, são necessários monitoramento oportuno e medicação individualizada.

 

Qual é a dosagem ideal?

 

A dosagem ideal varia de acordo com o paciente. As cápsulas de Atentah estão disponíveis em dosagens de 10 mg, 18 mg, 25 mg, 40 mg, 60 e 80 mg no Brasil. O médico pode ajustar a sua dose até a melhor resposta – isto é, a dose mais baixa na qual se experimenta a maior eficácia e melhora dos sintomas sem efeitos colaterais.

 

Quais as reações adversas mais comuns?

 

A atomoxetina foi geralmente bem tolerada em crianças e adolescentes com TDAH.

As reações adversas mais comuns da atomoxetina em crianças com TDAH incluem sintomas gastrointestinais, distúrbios do sono (sonolência), reações adversas cardiovasculares e outros distúrbios gerais (irritabilidade, tontura, fadiga, dor de cabeça).

 

Conclusão

 

Tratar o TDAH quando corretamente diagnosticado é a regra. As estratégias e medicações escolhidas são o ponto principal para o sucesso. Medicina baseada em evidências, centrada no paciente e suas características particulares e experiência clínica para tratar e manejar a medicação de maneira segura e atingir os objetivos propostos é uma arte.

Os pais e familiares se sentem seguros quando bem informados pelo médico assistente e as decisões devem ser compartilhadas na definição de estratégias e tratamentos atualizados. A visão da característica multidimensional e da Saúde Integral das crianças e adolescentes é determinante para o sucesso e garante segurança, eficácia e confiança ao longo do tratamento.




Dra Marcela Cavalcanti é neuropediatra há mais de 20 anos, atualizada e experiente no tratamento do TDAH no Brasil.


Fontes:


  1. Schwartz S, Correll C. Efficacy and safety of atomoxetine in children and adolescents with attention-deficit/hyperactivity disorder: results from a comprehensive meta-analysis and metaregression. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry. (2014) 53:174–87

  2. Fu D, Wu DD, Guo HL, Hu YH, Xia Y, Ji X, Fang WR, Li YM, Xu J, Chen F, Liu QQ. The Mechanism, Clinical Efficacy, Safety, and Dosage Regimen of Atomoxetine for ADHD Therapy in Children: A Narrative Review. Front Psychiatry. 2022 Feb 9;12:780921

  3. Garnock-Jones KP, Keating GM. Atomoxetine: a review of its use in attention-deficit hyperactivity disorder in children and adolescents. Paediatr Drugs. 2009;11(3):203-26.



 


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